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Gazeta Paços de Ferreira

30/10/2023, 0:00 h

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FESTAS POPULARES - DO RELIGIOSO AO PROFANO (2)

José Neto Opinião

OPINIÃO

Recordo como se fosse hoje. Na semana anterior à festa, aos finais da tarde, logo que rebentasse o primeiro dos morteiros, bem lá no alto, parecia que sentia um alarme da chamada para a correria. Primeiro, entre os carreiros do “engoeiro”, logo a seguir, entrava nas matas do “esganado” e, num rápido, já agarrava as últimas canas do foguetório.

Por José Neto (Doutorado em Ciências do Desporto; Docente Universitário; Investigador)

OPINIÃO

 

 

Dando continuidade ao artigo da edição passada, o dia da festa parece que estava vergastado pelo tempo, que depressa voava para a noite. Entrada das músicas, missa solene, procissão a preceito, cujos anjinhos se preparavam na nossa varanda e as desgarradas finais, que deixavam no ar um tempo de melancolia, cujo foguetório de encerramento anunciava saudade.

 

 

Nos dias que se seguiam, dava comigo a espreitar pela janela e, ao ver o retirar das bandeiras e coretos e, depois de mais perto, ver o desmanchar dos andores e demais arranjos, que davam à igreja uma tonalidade festiva, geralmente ficava com tonturas e meio adoentado e lá vinha a minha avozinha com uma chávena de chã de cidreira e bolachas maria (das grandes) e umas fatias de marmelada da loja da srª Casimira da venda, informando a D. Dorinda que, naquele dia e talvez no dia seguinte. não iria à Escola…

 

 

Outra festa que me marcou de forma profunda, era a Nossa Senhora do Pilar no 15 de agosto.

 

 

Recordo como se fosse hoje. Na semana anterior à festa, aos finais da tarde, logo que rebentasse o primeiro dos morteiros, bem lá no alto, parecia que sentia um alarme da chamada para a correria. Primeiro, entre os carreiros do “engoeiro”, logo a seguir, entrava nas matas do “esganado” e, num rápido, já agarrava as últimas canas do foguetório.

 

 

Numa das festas, teria uns cinco ou seis anos, lá fui, como sempre, com o meu avô Florêncio. Um espetáculo de homem que trabalhava arduamente as terras do lavradio de noite a noite e ainda lhe sobrava tempo para historiar, ao calor do brasido do lar, a ternura dos seus contos de fadas. E nas noites gélidas de inverno, levava-me embaladamente para a sua cama e com aquelas mãos grandes e calejadas, afagavam o meu rosto e por entre seus trémulos lábios se soltavam canções de adormecer!...

 

 

Bom, dizia eu, lá íamos à festa do Pilar e dos momentos mais desejados era ouvir a nossa Banda de música e aproveitar o intervalo do concerto para comer qualquer coisita.

 

 

Ouvir a música, pois claro, era engraçado ver toda aquela gente respeitosamente fardada a fazer melodia: o sr. Faustino no cornetim, os Soutos nos trombones, o Arlindo no bombardino, o sr. Joaquim Camolas na flauta, o tio Faustino da Inveja com os pratos …era um regalo ouvir a banda. Penso que me ficou essa paixão bem vincada até aos dias de hoje.

 

 

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No intervalo para o lanche, que bem sabiam aqueles bolinhos de bacalhau, numa fatia de regueifa fresca e dois golitos de vinho em caneca branca, das pipas do sr. Faustino da tulha.

 

 

Recordo um dia no final da festa e no regresso a casa, como tinham sobrado dois tostões do troco, fugi à atenção do meu avô e fui, num rápido à srª dos doces e, com o dinheiro à mostra, perguntei:

- Quanto custa um quilo de doces? … - Ó menino é muito caro – respondeu-me.

- E meio quilo? – perguntei novamente … A vendedora nem tão pouco respondeu.

 

 

Já a uns 30 metros do tabuleiro, voltei à carga, olhei para os dois tostões e voltei a perguntar: Quanto custa um doce? … Isso não chega meu menino!... respondeu com um sorriso!... E meio doce? -Teimosamente voltei a questionar…

 

 

A senhora olhou para mim de forma meiga e atenta, pegou num cartucho branco, com umas riscas rosadas e ofereceu-me três doces. De contente, saltei em corrida ao encontro de meu avô, já preocupado com o meu desaparecimento. Mas o melhor da festa foi aquele regresso a casa a oferecer a surpresa, feita em três doces embrulhados num cartucho à minha avó, que estava à nossa espera. Ah!... e também os dois tostões do troco no dia 15 de agosto – festa do Pilar!...

 

 

Esse meu Pilar, cujos fornos outrora, na noite da véspera da festa, faziam uma linha de fogo, vista pela noite adentro … Esse meu Pilar com um Cristo Rei de braços bem abertos prontos para abraçar quem O olha, protegendo toda uma terra, que lhe cai aos pés, prodiga de graça e formosura… Esse meu Pilar, que de lá o vento sopra e me traz a saudade do passado, encontrando um menino que, em dia de festa, subiu a encosta agarrado à mão de seu avozinho!...

(CONTINUA)

 


 

 

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