20/03/2022, 0:00 h
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A recente exposição mediática das impensáveis consequências da concessão privada dos serviços de abastecimento de água, no concelho de Paços de Ferreira, alarmou, justificadamente, muitos dos nossos munícipes. A situação é preocupante, e as reações revolta e indignação que suscitou são legítimas.
Mas a história não começa aqui. Em 2004, foi determinada uma sentença perniciosa, em virtude da assinatura de um contrato de concessão dos serviços de abastecimento e saneamento das águas a uma entidade privada – AGS –, que vinculou o município por um período de trinta e cinco anos. Um contrato sujeito a um caso base de previsão de crescimento populacional do concelho para mais de 80 mil habitantes. Para referência, no presente, o município de Paços de Ferreira tem menos de 56 mil habitantes. Este contrato condenatório previa um consumo médio per capita de 130 litros de água, quando o real não se afasta muito dos 80 litros. Previa, ainda, uma TIR – taxa interna de retorno – de 10,61 %. Pergunto-me, em boa-fé: quem recusaria uma taxa de rentabilidade desta proporção?
Volvido um ano apenas da celebração do negócio, já a concessionária exigia uma reposição do equilíbrio económico-financeiro ao município, no valor de cerca de 5 milhões de euros, pago pelo executivo social-democrata. Não se antevia, logo à partida, um futuro muito saudável para esta relação. Pedidos de reequilíbrio sucedidos de pedidos de reequilíbrio, é, atualmente, alegado pela concessionária um valor em dívida superior a uma centena de milhões de euros.
Convém, no entanto, entender a evolução recente desta concessão. Até 2019, a maioria do capital social da AGS Paços de Ferreira era detido pela Somague Ambiente, pertencente ao grupo espanhol Sacyr Vallehermoso. Nesse mesmo ano, a Somague Ambiente foi comprada pela Plainwater, uma sociedade gestora de participações sociais, empresa que, à data, era detida pela Azuladicional, ambas constituídas integralmente para esta operação e entregues à ECS Capital, um fundo de investimento. No início do ano de 2022, a Plainwater foi comprada pela Indaqua, empresa detida pela Miya Water, uma holding que integra empresas concessionárias de serviços de abastecimento de água. Em 2020, a própria Miya Water tinha já sido adquirida pela Antin Infrastructure Partners, um fundo de investimento com escritórios em Paris, Londres e Luxemburgo.
Hoje, o serviço de abastecimento de água e saneamento do concelho é um ativo financeiro sujeito à especulação do grande capital. A água é um bem essencial e a exploração das suas infraestruturas deve, sempre, servir o interesse público. Advogo para que sejam feitos todos os esforços no sentido de recolocar este serviço na esfera pública, de onde jamais devia ter saído. Cumpre-nos, a nós munícipes, nunca esquecermos quem são os responsáveis por estas escolhas políticas.
Ó ribeiras chorai, que eu não volto a cantar.
Miguel Lopes
Militante da Juventude Socialista de Paços de Ferreira
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