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Gazeta Paços de Ferreira

16/07/2024, 11:16 h

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Visita a antigos alunos da escola masculina da Trindade

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CULTURA

Encontrei na secretária de meu pai, Manuel Vieira Dinis, antigo professor na Escola Primária da Trindade (Meixomil), um conjunto de desenhos de seus alunos referente ao ano letivo 1956/1957, representando uma bilha e uma caneca. Decidi seguir o conselho da minha filha, que me sugeriu que entregasse pessoalmente aos respetivos autores as suas obras quase septuagenárias, admitindo que lhes poderiam proporcionar recordações felizes.

Manuel Vieira Dinis (Foto de arquivo)

 

Para localizar os destinatários, e dada a circunstância de ter deixado de viver na Trindade há muitos anos, comecei por telefonar à D. Rosinha da Avenida da Trindade a pedir indicação sobre as moradas, mas fui aconselhada a falar com a vizinha D. Gina, um poço de conhecimentos. Ora, a Gina, mais nova do que eu um mês certinho, foi minha companheira do jogo da macaca traçado na estrada em frente à padaria do Sr. Joaquim Lino. E os carros? Era o: lá vem um! A brincar a brincar, já lá vão 70 anos. A Gina era uma menina alegre e bem-educada e, quer perdesse, quer ganhasse o dito jogo, não faltava a sua expressão: É o “mesma”! Quando a contactei, mostrou logo a sua disponibilidade e acrescentou: Vai ser bem recebida por todos! E é que fui mesmo! Só lamentei que, dos 11 alunos, só restassem nove, pois os dois Alfredo já não estão entre nós.

 

 

30/9/2023 Graciano Teixeira de Brito (Penamaior)

(Graciano = grato, reconhecido)

 

Cheguei a Escariz, e depois da ajuda de uma senhora na sua janelinha e de um cavalheiro que teve a amabilidade de descer a sua escadaria, atravessar a rua e tocar a campainha certa, encontrei a pessoa desejada. Foi uma alegria imensa! Abraçou-me, beijou-me, e só não me pegou ao colo porque sempre eram uns quilitos. Falámos dos tempos passados e lembrou o seu assalto às cavalitas do Bispo (um colega) a um ninho de passarinhos junto de uma janela da escola e que não correu nada bem. A D. Alice estava ali presente a controlar o acontecimento. Já longe e dentro do carro, tive de corresponder ao aceno de uma mãozinha que não parava de dizer adeus. Em março deste ano, regressei a Escariz para entregar a cópia de uma fotografia publicada na Gazeta do jovem Graciano nos seus vinte e poucos anos. Achei graça ao caracol na testa (caça raparigas) com que conquistou a sua doce Alicinha.

 

 

7/10/2023 António da Silva Gonçalves (Meixomil)

(António = valioso, digno de apreço)

 

Ali ao pé da Trindade, no lugar do Muro, encontrei o anjo Clemente. Ai, o meu professor! A sua avó, a quem o meu pai chamava rainha da Inglaterra, ia com frequência aos domingos sentar-se num degrau em frente lá de casa à espera do cálice de vinho do Porto (ou não fosse inglesa). O senhor atencioso resolveu indicar, na sua viatura, o caminho para o palacete cor-de-rosa do Sr. Gonçalves. Acolheu-me a D. Adelaide, que tratou logo de chamar o seu António, que se mostrou preocupado com a tarefa que eu ia ter pela frente. Pessoa tímida, mas sempre com um sorriso para o seu desenho, que iria figurar no cantinho das coisas antigas. Ainda por ali passou a D. Maria da Quinta, que deu dois dedos de conversa.

 

 

14/10/2023 Manuel Dias da Rocha (Meixomil)

(Manuel = Deus connosco)

 

Em Meixomil, entrei no café Bons amigos, cuja proprietária é a D. Arminda que, natural da Trindade, logo me reconheceu. Senhora simpática, foi comigo ali ao lado chamar pelo nosso Manuel. E digo nosso, porque é de todo este grupo aquele com quem mais convivi, pois eu ia muitas vezes à oficina do Sr. Serafim, seu pai, levar os sapatos para compor. Pediu-me licença para me abraçar, e, enquanto conversávamos, estive com seu gato Miquinhas ao colo. Estaria sempre pronto se eu precisasse da sua pessoa.

 

 

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3/11/2023 António Carneiro Ferreira Mendes (Paços de Ferreira)

(António = valioso, digno de apreço)

 

No dia 21 de outubro, dirigi-me a Bouçós, onde moram familiares do Sr. Mendes. Na primeira porta em que bati, encontrei um antigo aluno do meu pai, o Sr. Abílio, com a D. Fátima, sua mulher. Ambos me receberam de braços abertos, mas já não posso dizer o mesmo dos seus barulhentos cãezinhos. Indicada a casa de um sobrinho do Sr. António Mendes, ainda tive a ajuda da D. Rosa, que, do alto do seu jardinzinho, chamou pela D. Luísa para vir atender uma senhora. A D. Luísa lá foi chamar o marido, o Sr. José Mendes, simpático mas pouco falador, ao contrário do mano Valentim, que apareceu logo de seguida e que não parava de elogiar o meu pai e a influência que teve na continuação dos estudos do tio Amâncio, que veio a ser um importante engenheiro em Lisboa. Pessoa prestável, até já estava pronto para me levar a Paços, a casa do tio António. Mas estes bonitos olhos azuis tinham ali perto de si o pequeno filho Vicente, que insistia em ser muito parecido com o pai, apesar de ser moreno e de os seus lindos olhos negros serem “franjados de longas pestanas da mesma cor”, como escrevia muitas vezes o escritor Arnaldo Gama. E agora, para a mãe do Vicente, D. Carla, um versinho de Guerra Junqueiro:

 

Moreno era Cristo.

Vê lá depois disto

Se ainda tens pena

Que as mais raparigas

Te chamem morena!

 

Munida do número do telemóvel do tio António, arranjado pelo Sr. José, parti dali tendo em vista o futuro encontro com o tio destas belas almas. Assim foi. No dia 3 de novembro, encontrei-me com o Sr. António Mendes e com a D. Conceição na rua atrás da igreja de Paços de Ferreira. O Sr. Mendes, tal como o Sr. Valentim, não parava de elogiar o meu pai e fez também alusão ao que ele fez pelo mano Amâncio. Mas o melhor de tudo foi quando se virou para o meu marido e lhe disse: Faça o favor de tratar bem esta senhora, nem sabe a sorte que teve. Aí, o meu ego inchou de tal maneira que quase voava ao céu. Por sua vez, a D. Conceição, ligada à casa de Pica Frio, lembrava-se em pequena de meu pai andar a fazer o estudo desta casa.

 

 

25/11/2023 Daniel Carneiro (Meixomil)

(Daniel = aquele que é julgado por Deus)

 

Com a ajuda de duas senhoras, lá encontrei o Sr. Daniel no seu altinho de Bouçós. A D. Aidé, afilhada da minha grande amiga quase centenária D. Aidé (Sancho) pouco demorou, pois estava atarefada com os preparativos para o almoço. O Sr. Daniel contou-me todo vaidoso como emprestou, deixando de trabalhar, a sua oficina para os ensaios da festa de homenagem que se realizou ao meu pai no ano de 1983. Eu estava com um bocadinho de pressa e o Sr. Daniel tanto queria conversar!

 

 

9/12/2023 José Ferreira da Conceição (Meixomil)

(José = aquele que acrescenta)

 

Aqui, nesta pequena rua, mora um Sr. Zezinho, disse-me um cavalheiro muito simpático que também ali habitava num prédio de andares, com os seus irmãos. Toquei à campainha e apareceu a D. Glória, que logo me reconheceu, dizendo que o marido estava ocupado a preparar o almoço. Prometi não demorar e lá foi chamar o marido, que surgiu munido de grande avental (Ai, que inveja!). Falámos sobre o rancho a que pertencia, e, quanto ao desenho, o Sr. Zezinho disse não ter grande habilidade, mas pelos vistos é um grande mestre de culinária. Estava triste, porque o seu muro do quintal, deitado abaixo pelas obras da estrada da Lameira, tardava em ser reconstruído, mas animou-se quando lhe falei no encanto que ele provocou à D. Glória com os seus lindos olhos azuis. No dia 14 de fevereiro de 2024, ao passar pela Lameira, o meu coração encheu-se de alegria – estavam a construir o muro do quintal do Sr. Zezinho e eu sei que isso o faz feliz.

 

 

9/12/2023 José Luís Leal Guimarães (França)

(José = aquele que acrescenta)

 

Deixei ficar um desenho com o Sr. José e a D. Glória – nós somos como irmãos! A D. Gracinda vem de vez em quando até Meixomil, o Sr. Guimarães está mais apegado ao país (França) que lhe deu trabalho, mas quem sabe se qualquer dia não regressará à sua Terra Natal.

 

 

 

 

6/1/2024 Alfredo Augusto Martins Carneiro (Meixomil)

(Alfredo = pessoa muito prática)

 

Foi pena não ter estado com o Sr. Alfredo. Faleceu em finais do outubro de 2023. Tive ocasião de contactar com a D. Glória e de lhe entregar o respetivo desenho. Disse-me possuir umas fotografias das festas que o meu pai realizava na escola e em que o Sr. Alfredo estava presente. Era um dos três alunos que estavam registados na minha memória: Alfredo da Ritinha, Graciano e Manuel Rocha.

 

 

13/1/2024 António Pacheco Vieira (Seroa e Ponte de Lima)

(António = valioso, digno de apreço)

 

A minha paragem foi à frente da antiga casa do Sr. Aranha, onde eu fui um dia ao batizado de um boneco em que o Alexandrinho fazia de padre. Com as obras, não se podia prosseguir, pelo que subi a Rua das Escolas e parei junto de um portãozinho aberto. A dona da casa, alma generosa, sem me conhecer, tentou telefonar para o senhor Valentim, irmão do Sr. António, mas acabou por me levar quase até à casa dele, na Rua dos Emigrantes – Eu a acompanhar pessoa desconhecida e afinal é filha da D. Augusta, que foi minha professora! Lá disse adeus à D. Olinda e toquei à campainha da família Vieira. Apareceu a D. Angelina, mas o senhor Valentim não se fez esperar. O irmão deveria estar na sua casa da Seroa. Arranjou-me o seu número do telemóvel e teve o cuidado de me levar de carro até ao meu ponto de partida. Estava uma manhã chuvosa, e, como não dava para as nossas tarefas de jardinagem na Trindade, resolvemos ir logo à Seroa, seguindo as indicações que me foram dadas. Lembro-me bem deste desenho e nunca pensei em revê-lo ao fim de tantos anos! Mas lembrava-se também dos nomes completos dos seus companheiros. Ó Sr. Antoninho Pacheco (como lhe chamam lá longe), como foi parar a Ponte de Lima? Foi um amigo meu da tropa que me apresentou a mulher da minha vida, que é daqueles lados.

 

Apresento-te a Inês

(Ai, que moça tão formosa!)

Já vou deixar Meixomil

E mudar-me p’ra Feitosa)

Mas não se esqueceu de Paços

Levou-o no coração

Fez construir na Seroa

Um bonito casarão

 

E já lá vão 54 anos de perfeita harmonia entre este feliz casal: António e Inês. Na despedida, o Sr. António Vieira ainda teve a gentileza de me oferecer um saquinho de batata-doce.

 

 

 

 

10/2/2024 Estanislau de Matos Monteiro (Paços de Ferreira)

(Estanislau = pessoa realista)

 

Não vi campainha, mas vi portão aberto. Toca a entrar, mas cheia de medo, depois de ter lido uma intimidação: cães perigosos. Subi a escadaria, bati na primeira janela que encontrei e veio ao meu encontro a D. Odília, que já contava com a minha visita (a cunhada, D. Gracinda, tinha-a informado) e lá chamou pelo seu Tilau – O meu Tilau é muito bonito, tem pouco cabelinho branco! Via-se que o amor andava ali de braço dado. Desta vez, o desenho já estava numa moldura, pois eu já o tinha entregado à mana D. Gracinda, minha vizinha na Trindade e cujo marido, o Sr. Joaquim do Outeiro, chegou a pegar em mim ao colo, conforme me relatou um dia. A D. Odília lá foi para as suas tarefas domésticas e eu fiquei na converseta com o Sr. Estanislau. Contou-me ele que foi aluno da terceira classe da minha irmã Adelaide, no ano em que ela iniciava a sua atividade docente. Disse adeus às ovelhinhas e ao grande cão que estava preso e que não gostou nada da minha presença, e tive a companhia deste senhor educado até ao portão de entrada, sempre zeloso com a minha pessoa, que me agarrasse ao corrimão, com receio de que caísse nas escadas. Tive ocasião de lhe contar que fui durante algum tempo madrinha de guerra do mano David, que infelizmente já não está entre nós.

 

 

14/2/2024 Alfredo da Conceição Carvalho Carneiro (Carvalhosa)

(Alfredo = pessoa muito prática)

 

Tive imensa pena de não conhecer a D. Margarida, viúva do Sr. Carneiro. Esta jornada foi uma tarefa muito complicada. Tentei seguir as indicações do Sr. Estanislau, julgando ser coisa fácil. Entrámos num autêntico labirinto, com um fervilhar de veículos, quer nas ruas mais largas, quer em pequenas ruelas. Além do contacto com várias pessoas, tenho de destacar duas senhoras: uma que morava nos Barreiros e que conhecia a D. Margarida, filha da D. Miquelina, e outra junto da fábrica do ferro, que me esclareceu onde ficava a oficina de estofos de um dos filhos, ali bem perto, e que me explicou que D. Margarida não estaria em casa, por se encontrar no centro de dia. Entreguei então os dois desenhos ao seu filho mais velho, o Sr. Carlos, que me prometeu levá-los à sua Mãe.

 

 

***

 

 

Por fim, quero agradecer à D. Georgina, à sua filha D. Fernanda, da Trindade, e também à D. Ermelinda Silva, de Bouçós, pelas informações prestadas, que me permitiram concluir com sucesso esta jornada.

 

 

Benilde Penha Dinis

 

 

 

 

 

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