Por
Gazeta Paços de Ferreira

18/02/2021, 1:01 h

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Política + Igreja = Polónia

Neste nosso canto à beira-mar plantado, houve tempo em que política governamental e Igreja confessional comiam na mesma mesa e dormiam na mesma cama. Não havia acto político sem a presença de um bispo, nem inauguração pública sem água-benta. 

Embora a Revolução Francesa fizesse a separação entre Estado e Igreja no século XVIII, na Península Ibérica de Franco e Salazar, Política e Igreja viviam em concubinato, para contento de uma população religiosa sem critério político de qualidade, e para descontento de quem ambicionava o fim da Ditadura e a instauração da Democracia.

O 25 de Abril de 1974 resolveu-nos o problema instituindo um regime político laico, separando-o da Igreja que tem total liberdade de culto, mas que não interfere nas leis da República (embora, particularmente, se manifeste contra elas, como as do aborto, da eutanásia e do divórcio, e alguns sacerdotes transformem missas em “comícios partidários” apoiando a extrema-Direita com a qual se identificam). 

Na União Europeia nem todos os países têm a sorte de possuírem uma Constituição moderna como a nossa, saída da Revolução de Abril e aprovada por unanimidade quase total (só o CDS votou contra) no Parlamento em 1976, reimplantando a Lei de Separação da Igreja do Estado no Artigo 41 §3. Na Polónia, por exemplo, o Povo continua a carregar o pesado jugo da Igreja em aliança com a Extrema-Direita no governo que restringe a liberdade de acção e de escolha dos polacos. 

O jornal Público de 8 de Fevereiro dá conta do grande número de crentes católicos que se afastam da Igreja pelo facto de, em Novembro de 2020, “os tribunais, com a ajuda do lobby dos bispos, decretarem a repressão ao aborto”. Mas o aborto é apenas uma parte do problema. Os cidadãos descontentes “manifestam sobretudo nas redes sociais, a crescente influência da Igreja Católica noutras áreas da vida”. 

Todos quantos estão a abandonar a Igreja expressam o descontentamento de a verem “ter cada vez mais influência na política, nos gastos do Estado, na Educação”. Quando o regime comunista foi derrubado em 1989, a Polónia contava com 90% de cidadãos no apoio à Igreja que tinha 32 milhões de fieis. Esse número desceu para menos de metade; são agora 41%. 

A Igreja faz propaganda eleitoral no decorrer das missas em favor do partido nacionalista no poder. A agência noticiosa Reuters contou 140 casos de promiscuidade entre política e Igreja nos últimos cinco anos, durante os quais se realizaram eleições. Lá, como cá, a Igreja considera o aborto um assassínio, o que motivou protestos com “dezenas de milhar de pessoas a bloquearem estradas e centros de cidades exibindo faixas com palavras de ordem como «Tirem os vossos rosários dos nossos ovários»”. 

A atitude da Igreja Católica polaca está a conduzir muitos fieis ao abandono do culto. Os nacionalismos políticos e as ditaduras eclesiásticas, quando juntos, são imensamente nefastos para os povos que têm a desgraça de viver sob tal regime. 

Curiosamente, a activista feminina que a Reuters entrevistou, acaba por dizer que até a sua mãe, devota católica, apoia a luta da filha pela separação de poderes… mas preocupa-se com os rituais fúnebres. “A minha mãe não conhece nenhum funeral além do católico, e tem medo do novo”! 

É este medo que modela o sentimento religioso quando a fé é um travão ao raciocínio livre, transformando cada crente num autómato.

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

Onofre Varela

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