Por
Gazeta Paços de Ferreira

13/06/2021, 1:08 h

309

O 10 DE JUNHO

Joaquim Leal

Corria o ano de 1944, e o nazi do bigodito feio mantinha-se laborioso no extermínio dos ciganos e dos judeus, na senda da sua criação suprema: a Raça Ariana. Com esses seres puros – dos quais ele nunca faria parte – dominaria o mundo. Por esses dias, nem lhe passava pela moleirinha o que lhe viria a suceder daí a uns meses.

Entretanto, por cá, o Tono de Santa Comba Dão embebecia-se com a grandiosidade do tal do bigodito, e molhava o travesseiro durante os seus agitados sonhos noturnos, desejando imitá-lo. Todavia, não o bafejara a inteligência, e restar-lhe-ia lamuriar-se se não dispusesse da Micas, uma solícita e perspicaz criada ao seu serviço. Ora, tomando esta servil criatura conhecimento dos desgostos do seu amo, rapidamente lhe segredou uma solução: a criação da sua própria raça ariana. Estávamos a 10 de junho de 1944, seria feita a inauguração do estádio do Jamor, e ele, Excelentíssimo Senhor Tono de Santa Comba Dão, declararia publicamente que, a partir dessa data, este dia se designaria de Camões e da Raça Portuguesa. Assim, sendo ele o chefe desta raça e dum império – ainda que império de papel – tornar-se-ia um importante general dos soldadinhos de chumbo que mandaria morrer por si em terras de além-mar. Perante esta ideia, a sua cabeça encheu-se de ares quentes intestinais. Pôs-se a divagar e imaginou que, para o extermínio, podia substituir ciganos e judeus por negros, porque dispunha de muitos nas colónias; que mandaria construir campos de concentração em África; que poria a funcionar fornos crematórios a energia solar, servindo-se da experiência do Tarrafal. Mas o ar requentado da sua cabeça chocou com o ar frio das nuvens, condensando-o, produzindo chuva que lhe resfriou os mal-amanhados circuitos neuronais. Desta vez, a meteorologia salvou-o, livrando-o dum enorme erro: os negros eram necessários para os serviços menores, como os penosos trabalhos nas roças. Ficar-se-ia pela raça e pela elite de Portugal.

Depois veio a Revolução, e discutia-se o fim dos festejos desta data quando alguém se impôs, dizendo: “Embora concordando com a maioria, recordo que o 10 de junho serve não só para comemorar a morte de Camões como também o nascimento do Quim Leal, pelo que proponho a manutenção deste feriado nacional. E se me dizem que se trata dum moço sem importância, imerecedor de qualquer tipo de celebração, afirmo-vos que é precisamente a sua não importância que lhe dá uma importância ainda maior”.

Eis por que a mim se deve este dia de folga no calendário português.

Joaquim António Leal

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