08/01/2021, 0:23 h
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A metamorfose: De vitima a opressor
Ao longo da minha vida vi muitas vezes os oprimidos tornarem-se oprimentes, os excluídos transformarem-se em exclusores, os subalternos revelarem-se subalternizadores e os humilhados passarem a humilhadores.
Vi pessoas, pertencentes a etnias, a adotarem posturas de distanciamento e xenófobas, face a outros elementos do mesmo grupo, querendo distanciar-se por sentir vergonha da sua etnicidade.
Vi emigrantes, bem acolhidos nos países que escolheram para viver, criarem dificuldades aos que, para aí pretendiam, também, emigrar, bem como a reproduzir discursos chauvinistas.
Vi, nas últimas eleições americanas, uma parte significativa dos mexicanos legalizados apoiarem Trump e as suas políticas de anti-imigração e, assim, pretenderem coartar a possibilidade de muitos dos seus compatriotas terem as mesmas oportunidades, que lhes assistiram.
Ou seja, porque é que determinadas pessoas, que tiveram outrora, ou têm atualmente, uma posição supostamente subalterna passam a partir, de determinado momento, a subalternizar ou a afastar-se de quem esteve ou está numa posição análoga à sua?
Porque muitos de nós transportam um medo latente e inconsciente de perder o lugar, entretanto conquistado, pretendendo eliminar, para isso, a concorrência.
Porque muitas das pessoas, que outrora foram excluídas, projetam ansiedades, fantasmas e mecanismos de defesa, porque se identificam, projetivamente, com o seu passado, que continua vivo na sua memória e lhes provoca angústia.
Entre aquilo que pretendemos ser e aquilo que somos, há sempre alguma distância e quando não temos capacidade para lidar com a imagem que os outros alimentam de nós, ou pensamos que alimentam, então tendemos a ir à procura da representação que idealizamos.
O medo da desinserção e do isolamento provoca sofrimento e, uma das formas de muitas pessoas se defenderem de um possível estigma, verdadeiro ou fantasiado, é distanciarem-se daquela condição, negando os outros que os fazem lembrar de si mesmos ou daquilo que não querem ser, ou voltar a ser. Assim, projetam nos outros os defeitos ou insuficiências, que os caracterizam, para tentar revalorizar a sua identidade e a forma como os outros os vêm, pretendendo identificar-se com os dominantes e privilegiados e afastando-se dos dominados e desfavorecidos.
Marcos Taipa Ribeiro
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