Por
Gazeta Paços de Ferreira

08/01/2021, 0:23 h

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A METAMORFOSE: de vítima a opressor

Marcos Taipa

A metamorfose: De vitima a opressor

Ao longo da minha vida vi muitas vezes os oprimidos tornarem-se oprimentes, os excluídos transformarem-se em exclusores, os subalternos revelarem-se subalternizadores e os humilhados passarem a humilhadores.

Vi pessoas, pertencentes a etnias, a adotarem posturas de distanciamento e xenófobas, face a outros elementos do mesmo grupo, querendo distanciar-se por sentir vergonha da sua etnicidade.

Vi jovens e adultos oriundos, de meios desqualificados com vergonha de serem identificados, como sendo originários desses meios e, assim, rejeitarem os seus semelhantes.

Vi emigrantes, bem acolhidos nos países que escolheram para viver, criarem dificuldades aos que, para aí pretendiam, também, emigrar, bem como a reproduzir discursos chauvinistas.

Vi, nas últimas eleições americanas, uma parte significativa dos mexicanos legalizados apoiarem Trump e as suas políticas de anti-imigração e, assim, pretenderem coartar a possibilidade de muitos dos seus compatriotas terem as mesmas oportunidades, que lhes assistiram.

Vi pessoas, que, por terem vergonha das suas origens, e da sua pertença social a rejeitarem todos os traços e sujeitos que os façam sentir-se próximos daquelas.

Ou seja, porque é que determinadas pessoas, que tiveram outrora, ou têm atualmente, uma posição supostamente subalterna passam a partir, de determinado momento, a subalternizar ou a afastar-se de quem esteve ou está numa posição análoga à sua?

Porque muitas dessas pessoas demonstram uma espécie de resistência à rememoração. Na verdade, estas, demonstram possuir uma resistência natural, transformada em sentimentos hostis, face a quem está próximo da sua condição ou face a quem os faz recordar e rememorar situações que vivenciaram, as quais foram negativas e que recalcaram.

Porque aqueles que nos fazem lembrar o que não desejamos ser, fazem-nos confrontar com a nossa fragilidade. Fazem-nos temer voltar ao que rejeitamos, representando um insuportável espelho para o qual nos é penoso olhar.

Porque muitos de nós transportam um medo latente e inconsciente de perder o lugar, entretanto conquistado, pretendendo eliminar, para isso, a concorrência.

Porque muitas das pessoas, que outrora foram excluídas, projetam ansiedades, fantasmas e mecanismos de defesa, porque se identificam, projetivamente, com o seu passado, que continua vivo na sua memória e lhes provoca angústia.

Entre aquilo que pretendemos ser e aquilo que somos, há sempre alguma distância e quando não temos capacidade para lidar com a imagem que os outros alimentam de nós, ou pensamos que alimentam, então tendemos a ir à procura da representação que idealizamos.

O medo da desinserção e do isolamento provoca sofrimento e, uma das formas de muitas pessoas se defenderem de um possível estigma, verdadeiro ou fantasiado, é distanciarem-se daquela condição, negando os outros que os fazem lembrar de si mesmos ou daquilo que não querem ser, ou voltar a ser. Assim, projetam nos outros os defeitos ou insuficiências, que os caracterizam, para tentar revalorizar a sua identidade e a forma como os outros os vêm, pretendendo identificar-se com os dominantes e privilegiados e afastando-se dos dominados e desfavorecidos.

Marcos Taipa Ribeiro

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