27/10/2022, 0:00 h
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Uma pedra no sapato
A vinda da cruz peregrina da Jornada Mundial da Juventude ao nosso concelho levou-me a recordar Jesus carregando a sua cruz a caminho do Calvário.
Na sua procissão pelas ruas, a dado momento, Jesus desfaleceu e caiu, e por ordem dos soldados, Simão de Cirene ficou encarregue de ajudar Jesus a carregar cruz, no restante caminho a percorrer.
Naquela imagem de sofrimento, Jesus representa todos os desprovidos, os pobres, as mulheres, as crianças, os idosos, os injustiçados… em suma, todos os que sofrem.
E em Simão podemos ver uma Igreja, que, não por ordem de soldados, nem de ninguém, se oferece em auxílio para ajudar todos aqueles, que Jesus representa.
É nesta Igreja, que ainda é uma das maiores, senão a maior instituição de ajuda no mundo, que muitos de nós segue, e preza. Aquela Igreja, que alivia o peso da cruz e da dor, e que está nas cidades com os sem abrigos, com os idosos, com os órfãos, com os que passam fome, e que está nas guerras, com os feridos, com os desalojados e com os refugiados.
A verdade instituição da Caridade, no seu pleno significado!
Mas, infelizmente, a Igreja é feita de muitos homens e muitas mulheres e, de entre tantos, as facções mais conservadores, e protectoras das suas verdades, vão renegando na sociedade aqueles que o tempo e as sociedades modernas acolheram, escamoteando, por vezes, o que deviam renegar e banir.
Se aquele Jesus, que carregou a cruz, voltasse, alguém tem dúvidas que ele teria, no seu grupo, mulheres com a mesma importância ou mais que os homens? Alguém acha que Jesus excluiria alguém pela sua orientação sexual?
Eu não tenho dúvidas disso, tal como não tenho dúvidas de que Ele, ao deparar-se com alguém que falasse em seu nome, e ao mesmo tempo fosse um molestador de crianças, teria a mesma reacção que teve no templo, quando encontrou os vendilhões.
Mas enquanto Jesus não regressa de novo, para tirarmos estas dúvidas, volto de novo à procissão de Jesus até ao Calvário.
Existe uma lenda, que fala num outro personagem, que interage com Jesus.
Conta-se que antes de Jesus receber a ajuda de Simão de Cirene, caiu com a cruz junto a uma loja ou oficina de sapatos, e que terá pedido ajuda ao sapateiro.
Habituado a ver os condenados a passarem na sua rua, o homem, em tom jocoso, disse-lhe que caminhasse. Então, Jesus ter-lhe-á dito que haveria de ser ele a caminhar pela Terra, até ao seu regresso.
Desde esse dia, diz-se que este judeu errante vagueia pelo mundo e, certamente, manterá o seu tom despiciente para com os que sofrem.
Por vezes, quando leio e oiço as palavras desfaçadas da linha de atuação pedida pelo Papa Francisco, parece que estou a escutar o sapateiro, que, jocosamente, negou ajuda a Jesus.
Não interessa há quanto tempo os crimes foram praticados, o importante é aliviar e retirar a cruz da dor, que as vítimas carregam.
A Igreja não pode olhar para as vítimas como uma pedra no sapato e atuar como o judeu errante. A Igreja deve olhá-las com caridade e ajudá-las, e ser, o que sempre foi, um Simão de Cirene, que se coloca ao lado de Jesus, ao lado dos necessitados, ao lado dos que sofrem!
Ricardo Jorge Neto
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