22/01/2023, 0:00 h
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Destaque Opinião António Colaço
O dia 10.01.2023 marcou a inauguração do ano judicial 2023 no Salão Solene do Supremo Tribunal de Justiça, patrocinada pelo seu Presidente, pela Procuradora-Geral de República e pela recém-eleita Bastonária da Ordem dos Advogados. Presidida pelo Presidente da República destacavam-se as presenças do Presidente da Assembleia de República e da Ministra de Justiça. Trata-se sem dúvida de um acontecimento de vincado significado num Estado de Direito como o nosso.
Com efeito, dos 4 Órgãos de Soberania, o Tribunal (composto pelo juiz, o agente do ministério publico e o advogado, auxiliados pelo respetivo quadro de funcionários) é o que conserva em última análise a esperança terminal e a confiança de um regime democrático.
Ao contrário do que acontece em muitas outras celebrações, os discursos, proferidos perante uma plêiade de entidades institucionais, personalidades e individualidades da classe profissional, fugindo a generalidades ou contextualizações parcelares da função estadual na realização de justiça, primaram por uma objetividade ímpar, insistindo nos aspetos, há muito contestados, e que na atualidade mais tem contribuído para a disfunção da justiça inquinando a sua feitura na atualidade.
Assumido que a “justiça é uma questão política”, o seu tratamento não pode fugir ao ditame Constitucional. Os tribunais, sendo independentes, administrando a justiça em nome do povo, na estrita medida em que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei (art. 13º.1.), a todos estando assegurado o acesso ao direito e aos tribunais, estão condicionados na atualidade por três os polos que continuam a impedir a realização prática de justiça em termos democráticos – o acesso; os serviços e o processo.
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Está por realizar a cabal democratização do acesso do cidadão à justiça. Tal propósito de cidadania só é exequível, como se sabe, através de imediata alteração do montante de custas judiciais, a começar pela redução geral do seu montante e do correspondente ajustamento proporcional à situação económica do interessado. Uma tal medida irá facilitar o patrocínio oficioso de advogado pondo assim termo à situação de muitos cidadãos que se vêm impedidos de recorrer ao tribunal por falta de meios económicos. Em democracia a justiça não pode ser só para os ricos.
Mas mesmo assim, é um dado constatado que uma grande parte de tribunais está, nas atuais circunstâncias, à beira de “rutura” do sistema, se não forem tomadas medidas para colmatar a falta de funcionários dignificados e um atualizado sistema operativo. Estas medidas passam forçosamente pela autonomização dos tribunais, consubstanciada em dotações orçamentais individualizadas, independentes do Ministério de Justiça, há muito reclamadas, por só assim ficar assegurada a independência do Tribunal, enquanto órgão de soberania.
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Finalmente não passou despercebido o incisivo apelo à alteração de leis processuais, tanto do foro civil como criminal, visando sobretudo dar uma resposta à crítica quanto à morosidade no andamento dos processos. Apontam-se, pelo menos três aspetos que demandam urgente solução. i) a revisão de leis de processo nas diversas jurisdições, com destaque à desburocratização do formalismo de comunicação e/ou notificação de atos judiciários, à agilização da produção de provas, ao condicionamento da faculdade de adiamento de julgamentos e à restrição da prática de atos processuais marcadamente dilatórios; ii) a eliminação uso abusivo de recursos, interpostos apenas para ganhar tempo ou para a prescrição em sede criminal. ii.a) Ainda neste domínio, a fase de instrução deve confinar-se, em termos constitucionais, à atividade própria de um “juiz de liberdades” e não se transformar numa de pré-julgamento, para o gáudio de muitos arguidos ou como é o caso de alguns “megaprocessos”, que se arrastam no tempo e o risco de prescrições. Atente-se que “O direito a um julgamento justo …..não é sinónimo do direito a não ser julgado…”. iii) A imparcialidade e isenção de um magistrado é salvaguarda quando a função é exercida numa dimensão de exclusividade, sendo por isso incompatível com o regresso à magistratura, daqueles que se empenharam em funções não-judiciárias. Urge finalmente assegurar que o CEJ, seja uma escola de formação democrática dos futuros magistrados, sendo inexplicável que, apesar de sua existência há mais de 40 anos, ainda haja tribunais com falta de magistrados.
A realização de justiça num Estado de Direito Democrático é um processo de afirmação continua e atualista de valores. Para o Presidente do STJ, sem justiça não há segurança, não há ordem nem paz social, não há liberdade, não há democracia. Estamos com ele.
Lx- 19.01.2023
António Bernardo Colaço (juiz -Conselheiro do STJ – Jubilado)
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