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Gazeta Paços de Ferreira

17/12/2021, 0:00 h

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A PRENDA DE NATAL, UM FILME

Opinião

Temo que na vertigem destas peripécias mais ou menos hollywoodescas, em que muitos se entretêm, como se de uma série televisiva o fosse, possa passar despercebido o contexto deste capitalismo de bordel, desta economia de casino, onde desaguam há muitos anos todas as irregularidades, todas as corrupções, todas as manobras especulativas.

Os dias informativos do presente estão cheios até à exaustão da história rocambolesca de um banqueiro de seu nome Rendeiro que, em fuga à justiça terrestre e a decisões judiciais incriminatórias, foi agora preso em lugar distante, onde provavelmente se sentiria seguro para toda a vida. A estes dias adicionam-se agora num frenesim de referência urgente muitos pormenores, revisões cronológicas, argumentos jurídicos, antecipações de um futuro próximo para um foragido à lei. São constantes e diversificadas as informações. Sabemos literalmente tudo, mesmo o que era escondido outrora. Porquê?

Acumulam-se justos tributos à ação da Policia Judiciária portuguesa e das autoridades policiais transnacionais, com referências minuciosas a estratégias e a competências. Há protagonistas da cena politica nacional que não perdem a oportunidade de (mais uma vez) aparecer, valorizar, comentar o tema, como se este fosse o alfa e o ómega da vida dos portugueses. Ou uma novidade surpreendente. Porquê? Será por ser Natal?

Quando ultrapassada esta fase, há contudo dúvidas essenciais a esclarecer.

Será que após o “esgotamento” do tema, nesta sua versão detectivesca e geograficamente global, não haverá um silenciamento, um esquecimento das razões objectivas por que há neste país Rendeiros (com este ou com outro nome, banqueiros e políticos), que cometem crimes de falsificação informática, de falsificação de documentos, de fraude fiscal e de abuso de confiança, de branqueamento de capitais e que portanto devem ser punidos? Tenho sobre isto muitas dúvidas.

Temo que na vertigem destas peripécias mais ou menos  hollywoodescas, em que muitos se entretêm, como se de uma série televisiva o fosse, possa passar despercebido o contexto deste capitalismo de bordel, desta economia de casino, onde desaguam há muitos anos todas as irregularidades, todas as corrupções, todas as manobras especulativas.  Falta-nos uma ética democrática, e uma pedagogia, que explique porque por ausência de mecanismos de regulação financeira, ou uma informação séria e competente, se permite que por acção de alguns muitos vejam defraudadas as suas poupanças em milhões de euros. Rendeiro não é único.

E admito também que possa ser considerado para muitos  normal, acima de qualquer suspeita, as delongas dos inúmeros processos judiciais, que tratam de forma desigual ricos e pobres, poderosos e vítimas, quando se trata de prazos dilatórios, expedientes processuais, ou outras parcelas do cumprimento da Justiça. Veja-se o recente episódio dos dez anos de processamento da acusação de participação económica em negócio das PPP´s a ex-governantes socialistas.

Que país é este? Que poder político é este que vê com cinismo comparecer perante a Justiça, os amigos, companheiros e cúmplices de gestão de interesses públicos e privados de há décadas? Afinal o filme, Rendeiro servido em travessa de prata, pode não passar de uma prenda de Natal. E Natal não é todos os dias.

Cristiano Ribeiro,Dirigente do PCP

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