ACERCA DE UM PLANO DE EMERGÊNCIA PARA A SAÚDE

OPINIÃO POLÍTICA

Por isso é agora impossível assegurar um serviço universal, público, acessível, tendencialmente gratuito e de qualidade. O que existe atualmente é uma manta de retalhos, um sistema em permanente estado de sítio.

A Ministra Ana Paula Martins do PSD parece reproduzir quase ipsis verbis as políticas de Marta Temido e Manuel Pizarro do PS. O seu Plano de Emergência e Transformação para a Saúde, elaborado no seu miolo por uma Consultora privada, constitui-se em uma estafada agenda de propósitos em que estão plasmadas canhestras soluções de curto prazo como, a saber, incentivos para a recuperação da lista de espera da cirurgia oncológica, o atendimento de doentes urgentes, a situação da Medicina Geral e Familiar, a assistência materno-infantil e as doenças mentais.

Aparentemente estas são as prioridades mais mediáticas para as políticas governativas em 2024. Não desconheço a gravidade dos problemas assim emergentes, quer para responsáveis políticos, quer para a sociedade portuguesa. Porém esse será parte da face visível do icebergue. E as soluções não poderão ser temporárias, incertas, casuísticas, sem atentar na face submersa do mesmo icebergue.

Detalhemos o anunciado. Parcerias, pois claro, já o sabíamos, prática anterior usada mil vezes. Incentivos para a recuperação da lista de espera de cirurgias oncológicas: muito bem! Pagar-se bem melhor um trabalho extraordinário, fora das horas legais, a uma equipa reduzida e pronto, eis medida inovadora, a resposta, pensarão alguns. Mas pergunto: não precisaria o SNS de uma melhor organização, de uma efectiva responsabilização das equipas, de incentivos na atividade regular do dia-a-dia evitando o abandono de profissionais, a sua limitada “produtividade” ou a tendência á desestruturação dos serviços com estas políticas fracionistas?

Atendimento de doentes urgentes: muito bem! Para casos ditos menos urgentes, sugere-se então Centros de Atendimento Clinico. O que são? Onde funcionam? Que capacidades? Como são constituídos? Para que urgências? Serão novos nomes para os tradicionais Centros de Saúde? Perguntas que qualquer cidadão fará, mas que duvido que a Senhora Ministra queira responder, antes delegará para a dita Consultora privada.

Para além do SNS 24, existirá uma linha SOS Grávidas que só estou certo não fará partos on line. Aumentar a capacidade de realizar partos no SNS através de incentivos às equipas ou ao local de assistência constitui mais uma medida placebo e de criação de uma desigualdade evidente, de aplicação do pior liberalismo.

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A situação da Medicina Geral e Familiar constitui-se em um pesadelo assistencial não estando assegurada qualquer equidade social ou coesão territorial, independentemente do esforço dos profissionais. Enquanto autarcas e populações não assumirem nas suas mãos os reais interesses das localidades, participando nas reivindicações de profissionais de saúde, nada se transformará de forma positiva.

Quanto às doenças mentais, o problema é demasiado sério para ser objecto de uma citação em parágrafos.

A montanha pariu um rato. Enfezado. Se um qualquer aluno do 1.ª ano de um curso de Saúde Pública apresentasse um tal estudo/projeto sobre o diagnóstico e propostas para a Saúde em Portugal, o “chumbo” era certo. Seria certamente aconselhado a procurar outros rumos, outros caminhos. Este é portanto o panorama negro da Saúde. Uma generalizada falta de visão, uma indiscutível falta de ambição.