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Gazeta Paços de Ferreira

31/08/2025, 0:00 h

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Sicómoro* Quando os católicos se calam, a política perde a alma

Opinião Sérgio Carvalho Religião

RELIGIÃO

A participação dos cristãos na vida política é, desde sempre, um tema sensível, mas inadiável. Muitos católicos, por receio de polémicas, por hipocrisia ou por desilusão com a qualidade da política, optam pelo afastamento, como se a fé devesse ficar encerrada no espaço privado.

Por Sérgio Carvalho (Professor e jornalista)

 

No entanto, a Doutrina Social da Igreja recorda com clareza que a fé tem consequências públicas. O Compêndio da Doutrina Social da Igreja afirma: “Não é lícito que os fiéis se retirem do compromisso político, porque a indiferença ou o ceticismo acabam por favorecer a difusão da injustiça” (CDSI, 565).

 

Não se trata de impor uma visão confessional num Estado plural. Trata-se, antes, de não abdicar de valores fundamentais como a dignidade da pessoa humana, a justiça social, a defesa da vida, a solidariedade, a ecologia integral e a promoção do bem comum. Bento XVI, na encíclica Deus Caritas Est (Deus é Amor), escreveu que “a Igreja não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça” (n.º 28). Quando os cristãos se retiram da arena política, deixam um espaço vazio que rapidamente é ocupado por interesses particulares ou ideologias que esquecem a pessoa.

 

O Papa Francisco insistiu na necessidade da “boa política”, aquela que não se rende à corrupção, nem à manipulação, mas que olha para os mais pobres e frágeis. Na exortação Evangelii Gaudium (Evangelho da Alegria), recorda: “A política, tão denegrida, é uma das formas mais preciosas da caridade, porque procura o bem comum” (EG, 205). A política, embora tantas vezes desacreditada, continua a ser o lugar onde se organizam as condições para que todos possam florescer.

 

 

O envolvimento pode assumir múltiplas formas. Nem todos são chamados a candidatar-se a cargos públicos, mas todos têm deveres cívicos: votar de forma consciente, participar em associações, intervir no espaço público com voz crítica e construtiva. Como lembra o Compêndio, “a participação é um dever que todos devem conscientemente exercer” (CDSI, 189). A indiferença não é opção para quem acredita num Deus que se fez homem e entrou na história.

 

É certo que os católicos devem agir com humildade e diálogo, respeitando a diversidade de opiniões legítimas. Não existem soluções únicas para os problemas sociais, mas há critérios éticos que não podem ser negociados. O contributo dos cristãos será tanto mais fecundo quanto mais se fundar no testemunho, na coerência de vida e na busca sincera do bem comum.

 

Hoje, mais do que nunca, a política precisa de cristãos que não tenham medo de ser luz e fermento no meio da massa. Como dizia São João Paulo II, “a Igreja valoriza a democracia, mas lembra que ela só é possível se for fundada na verdade do homem” (Centesimus Annus, 46). O futuro da sociedade não se decide apenas nas igrejas ou nas praças, mas também nas assembleias e instâncias de decisão. Participar é um dever de consciência. A fé que se cala diante da injustiça não é fé viva; a fé que se compromete transforma o mundo.

 

* O sicómoro é uma árvore mencionada na Bíblia que simboliza o Caminho de encontro com Deus (como aconteceu com Zaqueu); Símbolo de fecundidade e vida; e, em algumas tradições cristãs, representa a perseverança espiritual.

 

 

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