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Gazeta Paços de Ferreira

22/06/2023, 0:00 h

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PATRIOTAS POR UM DIA

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OPINIÃO POLÍTICA

No dia 10 de junho, apregoa-se a unidade da nação, a sua coesão, a convergência de interesses, a paz social, a nossa casta, a nossa identidade, a nossa história. É um passado glorificado, para um presente envernizado. Como diria o José Mário Branco, nos tempos presentes: ó tuga, glorifica, glorifica, enverniza, enverniza.

Cristiano Ribeiro

 

No dia 10 de junho nascem e morrem muitos patriotas em Portugal, digo eu, não no sentido físico mas no sentido metafórico.

É o dia dos discursos oficiais, dos diagnósticos primordiais, das preocupações fundamentais. Para além de uns quantos, para quem o 10 de junho não passa de mais um feriado, temos um leque alargado de pessoas que comemora o dia perfilando-se quando soa o hino ou passa um desfile militar ou de forças da proteção civil. É o respeitinho mais ou menos cerimonioso perante os símbolos iconográficos da Pátria, já cantada por Camões, Pessoa ou Saramago.

 

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E no dia seguinte, tudo retoma a velha normalidade, de usurários e fariseus, lambe-cus e amanuenses, trafulhas e servos de doutores e engenheiros, sempre disponíveis para a arte da genuflexão e para as preces do foro sobrenatural.

Conquanto o dia seja só de 24 horas, e não mais um minuto, torna-se adequado aproveitá-lo para umas afirmações mais impressivas. Desta vez, falou-se no Douro vinhateiro, uma zona esquecida para as suas gentes e necessidades. Desta vez, falou-se na produção local de riqueza, que escorre daquelas encostas solarengas e do suor de muitos, para os bolsos dos proprietários e da burguesia mercantil, como acontece há centenas de anos. Foi lindo, pá, mesmo que por um só dia, nem mais um minuto.

Desta vez, falou-se (ou dever-se-ia ter falado) das vias de comunicação do centro do Douro vinhateiro ao litoral. Foi oportuno, pá, lembrar, muito obrigado, senhor presidente, nem sabe o que a nossa vida seria sem o senhor. De outras vezes, falou-se de outra coisa qualquer, que palavras leva-as o vento e papagaios por aí não faltam ou não fossemos um país quase tropical.

 

 

 

E no dia seguinte, lá estaremos com a velha sanfona, velha telenovela, de muitos episódios, onde o rico enriquece e o pobre, enfim, assim permanece. Mas sempre recetivo à esmola, à referência, à reverência, à promessa. Hoje não é, mas amanhã será, haja fé. Ámem!

No dia 10 de junho, apregoa-se a unidade da nação, a sua coesão, a convergência de interesses, a paz social, a nossa casta, a nossa identidade, a nossa história. É um passado glorificado, para um presente envernizado. Como diria o José Mário Branco, nos tempos presentes: ó tuga, glorifica, glorifica, enverniza, enverniza.

E no dia seguinte, há tempo para ver que sobra mês ao salário, ou à pensão de reforma, há tempo para escolher o medicamento indispensável num conjunto de fármacos prescritos, há tempo para recolocar nas exíguas divisões a benvinda família despejada pelo senhorio ou pelo banco.

 

 

 

 

Hoje não, hoje é dia de festa nacional. Não se fale da TAP, do SNS, da Escola Pública, da seca, da interioridade, da desertificação. Não. Não se fale do crescimento económico, de rendimento, de futuro.

Sejamos patriotas. Por um só dia. Mais do que um dia, já é convição revolucionária. E perigosa.

CR

 

 

 

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