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Gazeta Paços de Ferreira

31/08/2025, 0:00 h

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A FESTA DO PILAR

Cultura José Neto Opinião Penamaior

CULTURA

ENTRE ESPAÇOS DE MUDANÇA ENCONTRADO
COM A MESMA DEVOÇÃO FESTEJADO

Por José Neto (Doutorado em Ciências do Desporto; Docente Universitário; Investigador)

 

Aprendi a correr para os pés do Cristo Rei ainda pequenino, intervalando o colo do meu avô e o caminho estreito de terra batida nos dias de novena, anunciadores da Festa do 15 de agosto.

 

Recordo como se fosse hoje… logo que rebentava o primeiro dos morteiros bem lá no alto, parecia que sentia o alarme de chamada para o arranque da correria. Primeiro entre os carreiros do “engoeiro”, logo a seguir entrava nas matas do “esganado” e, num rápido, já agarrava as últimas canas do foguetório.

 

– Numa das Festas, tinha eu para aí uns 5 ou 6 anos, lá fui como sempre com o meu avô Florêncio.

 

Ouvir a música, pois então, era engraçado ver toda aquela gente respeitosamente fardada a fazer melodia… e tínhamos muita gente de Penamaior a tocar – o sr Faustino que fazia o cornetim cantar, os Soutos nos trombones, o sr Joaquim e mais tarde o Arlindo no bombardino, o sr Joaquim (camolas) na flauta, o tio Faustino de Inveja com os pratos… até o moço dos papéis era da casa – como é que não haveríamos de gostar de os ouvir (desde esse tempo que me ficou a paixão por ouvir a nossa Banda).

 

No intervalo para o lanche… que bem sabiam aqueles bolinhos de bacalhau deitados na regueifa fresca e a caneca branquinha de vinho tinto que segurava a todo o preceito, pois claro, um golito não fazia nada mal – era das pipas do sr Faustino da Tulha!…

 

No regresso a casa e como tinham sobrado dois tostões do troco, fugi à atenção do meu avô e fui, num rápido, à senhora dos doces. Com o dinheiro à mostra, perguntei:

 

Quanto custa um quilo de doces?

 

— Ó menino é muito caro! – Respondeu-me ela.

 

E meio quilo? – Perguntei novamente… a vendedora nem tão pouco respondeu.

 

Já ía a uns trinta metros do tabuleiro… e voltei à carga, olhei para os dois tostões e voltei a perguntar:

 

Quanto custa um doce?

 

Isso não chega meu menino! – Respondeu-me a senhora dos doces com um sorriso.

 

E meio doce? – Teimosamente voltei a questionar.

 

A senhora olhou para mim de forma meiga e atenta, pegou em dois doces, meteu-os num cartucho branco, com umas riscas avermelhadas e mos ofereceu.

 

De contente, saltei ao encontro do meu avô, já preocupado com o meu desaparecimento. Mas o melhor da Festa foi aquele regressar a casa e oferecer a surpresa, feita em dois doces embrulhados num cartucho à minha avó, que estava à nossa espera. Ah!… e também os dois tostões do troco!…

 

Passados alguns anos vi-me voluntário a prestar serviço militar no radar do Pilar!…  Um dos objectivos para que me visse nos 6 anos de voluntariado foi organizar o tempo para me preparar para a vida e o facto é que ingressei na vida militar com a frequência do 5.º ano e quando passei à disponibilidade estava na Faculdade de Direito (Coimbra)… tendo outros voos a aguardar para o encontro da minha felicidade profissional.

 

 

 

 

A minha especialidade era a de Operador de Radar – um avião que levantasse voo a 220 milhas (mais ou menos em Madrid), era imediatamente detectado e a nossa obrigação era segui-lo através do plano de voo, altitude, velocidade, etc… para além de outros exercícios militares.

 

Trabalhávamos em regime de turnos – 24 horas de serviço e 48 horas de descanso. Se os dias de folga os preenchia por casa, pelos cafés do Gomes e do Amândio – estudava numa segunda mesa, numa rica salinha de chá que dava àquele café uma graça especial, o dia de serviço era no Pilar.

 

Trabalhava uma hora e descansava outra; essa, dita de descanso, era bem-vinda para, de livro e sebenta abertos, ultrapassar as redes, descer um pouco mais para as lajes a caminho da cova da loba ou então ficar mais perto e meter-me pelos encantos debaixo do sobreiro ou no muro da capela da Senhora ou ali na escadaria que desce para o forno, ou ainda debaixo dos braços do Cristo Rei – eu sei lá – pedaços de vida de estudo ganhos naqueles recantos que hoje visito com saudade e que outrora serviram de assento, encanto ou passadeira na preparação de mais uma dispensa da oral na minha vida de militar/estudante!…

 

O meu Pilar… que de lá o vento sopra e me traz a saudade do passado!… Subo ao teu encontro para ver o mar e, no horizonte infinito, encontrar o menino agarrado a uma mão calejada dum grande senhor chamado Florêncio que eu humildemente persisto em honrar!…

 

Este Pilar do Ermitão, cuja lenda a história Pacense conta!…

 

O meu Pilar cujos fornos outrora, nas vésperas da Festa, faziam uma linha de fogo vista pela noite adentro e que hoje gostava de ver reconstruídos onde o anho pudesse servir de ementa das famílias comunitárias que os visitassem!…

 

Este Pilar com um Cristo Rei de braços bem abertos prontos a abraçar quem o olha. Ainda hoje, quando subo ao seu encontro olho-O e quase sempre experimento uma imagem descrita por um sentimento de cumplicidade. Contemplo este Cristo protetor de toda a minha terra que lhe cai aos pés, pródiga de graça e formusura.

 

Mas se houve necessidade de cultivar memórias e convertê-las em saudade foi este ano.

 

Devido às normas governamentais este 2025 vai ficar marcado na história das Festas, jamais acontecido, dada a impossibilidade de realização dum programa devidamente elaborado num local paradisíaco e que a história do tempo tem venerado. Foi a questão da probabilidade de incêndio que em termos nacionais a isso obstou, quando, penso eu, com outros argumentos de vigilância e defesa poderia ter sido levada a efeito. Mas por questões de segurança, desta forma ficamos aliviados e a festa aconteceu. Não foi num local, mas em dois bem distintos que a Comissão de Festas constituída de gente de palavra e nobre de sentimentos se obrigou a sacrifícios de “derrear o corpo e a alma” dando satisfação ao acontecimento que marca a legítima vontade de aplaudir um programa de eleição, tão distinto e belo, onde a cultura dum povo se revisitou entre a graça divina e a ternura do cumprimento dum desejo de gritar bem alto VIVA PENAMAIOR.

 

A minha solidária e permanente vontade de aplaudir.

 

 

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