Por
Gazeta Paços de Ferreira

29/01/2025, 10:43 h

356

POR UM CÓDIGO DE CONTRATOS DE CONSUMO

Mário Frota Opinião

DIREITO DO CONSUMO

Não se pode codificar pretensamente para se deixar tudo aparentemente na mesma com um ror de normas extravagantes ou avulsas que o regime do Código não dispensará...

POR UM CÓDIGO DE CONTRATOS DE CONSUMO

 

Que tarda…

Em 2014, no n.º 79 da RPDC - Revista Portuguesa de Direito do Consumo, que criáramos em Coimbra em 1995, escrevíamos, em contundente crítica a um ‘aborto jurídico’ apresentado por uma tal Comissão de Codificação do Direito do Consumo, constituída em 1996 sob a égide de Elisa Ferreira, ministra do Consumo:

“Se compulsarmos o anteprojecto do [denominado] Código de Consumidor, tal como a Comissão o gizou, surpreendemos na secção VI do capítulo IV do título II, uma parte aparentemente reservada aos contratos típicos de consumo, nela figurando:

- Compra e Venda de Bens de Consumo

- Concessão de Crédito

- Serviços Públicos Essenciais

- Direito de Habitação Periódica

- Viagens Turísticas e Organizadas

Ora, no âmbito dos outrora denominados “serviços públicos essenciais”… não há um efectivo tratamento dos contratos que nesse quadro se manifestam. Antes – e tão só – a transcrição original da Lei 23/96, de 26 de Julho (sem sequer se haver tomado em linha de conta as alterações entretanto introduzidas). …

E não há um tratamento autónomo de cada um dos contratos típicos pelas especificidades que postulam, moldes que se acham dispersos por inúmeros diplomas legais que nem são tocados, aflorados, referenciados sequer...

Não se pode codificar pretensamente para se deixar tudo aparentemente na mesma com um ror de normas extravagantes ou avulsas que o regime do Código não dispensará...

E, como “serviços essenciais”, considera só – e tão só – o fornecimento de

• água

• energia eléctrica

• gás, gás de petróleo liquefeito canalizado

• telefone (qua tale)

Esqueceu-se a preclara Comissão de considerar como espécies típicas, em inovação que importaria ousar, as que segue:

• contrato de serviços de saúde

• contrato de serviços educacionais

• contrato de utilização das auto-estradas

• contrato de serviços postais (ulteriormente inseridos na Lei de Protecção dos Consumidores de Serviços Públicos Essenciais)

• contratos de serviços de comunicações electrónicas, a saber

- acesso à internet

- acesso à televisão por cabo

- demais serviços neste âmbito cuja regulação se torne adequada.

Para além dos contratos de recolha dos resíduos sólidos urbanos (lixo) ou de águas residuais ou efluentes (saneamento e esgotos), mais tarde reconduzidos ao elenco de “serviços públicos essenciais” pela lei ordinária que os não considerara como tal na versão original…

No entanto, há um ror de contratos que carecem de ser disciplinados (ou consolidados ante a dispersão normativa subsistente) pelo legislador, neste particular, a saber:

• contrato de serviços de transporte

- aéreo

- marítimo

- fluvial

- ferroviário

- rodoviário

• contrato de alojamento turístico

- contrato de albergaria ou pousada

- contrato de arrendamento por breves períodos em praias, termas ou outros lugares de vilegiatura (alojamento local)

• contrato de base de cartões turísticos ou de férias

• demais contratos de serviços turísticos (de molde a proibir, entre outros, os consumos mínimos nas salas de dança ou de espectáculos)

• contrato de compra e venda de imóveis

• contrato de compra e venda de coisas móveis

• contrato de compra e venda de semoventes usados

• contratos electrónicos ou digitais

• contrato de mediação imobiliária

• contrato de promoção imobiliária

• contrato de gestão de condomínios

• contratos de seguros obrigatórios

• contratos de serviços mínimos bancários

• outros contratos bancários

• contrato de emissão de cartões de crédito

• contrato de serviços financeiros à distância

• contrato de aparcamento de viaturas

• contrato de empreitada de coisa móvel

• contrato de empreitada de coisa imóvel

• contrato de mediação matrimonial

• contrato de serviços funerários

. …

Daí que se exigisse que o legislador se não distraísse neste passo. E fosse fundo numa abordagem do estilo. Para que o Código não seja um mero arremedo agregador de diplomas com todas as excrescências deles constantes.

E, o que é mais, com um pretenso esforço de codificação, se dispusesse a manter um ror de diplomas extravagantes exactamente na esfera da legislação avulsa, não a abarcando nem a fundindo na sua mancha…

Se o campo de eleição do Código é o dos actos e contratos de consumo, domínios como estes jamais poderiam ser descurados.”

Do que carecemos, hoje em dia, é, na verdade, de um Código de Contratos de Consumo: enxuto, abrangente, para que a disciplina das relações jurídicas de consumo lhe não escape!

 

Mário Frota

presidente emérito da apDC –DIREITO DO CONSUMO - Portugal

 

 

ASSINE GAZETA DE PAÇOS DE FERREIRA

Opinião

Opinião

Instituições Particulares de Solidariedade Social

6/07/2025

Opinião

Habitação, promessas no papel, silêncios no terreno

6/07/2025

Opinião

A mobilidade pública é uma questão de justiça

6/07/2025

Opinião

SE ALGUÉM MERECE OS PARABÉNS, É A COMISSÃO DE FESTAS!

6/07/2025