07/09/2024, 0:00 h
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Desporto Opinião Abílio Travessas
DESPORTO
OPINIÃO
O ano foi de grandes acontecimentos: a guerra no Vietnam recrudesce com ataques dos vietcongues a Saigão; a Primavera de Praga, na Checoslováquia – comunistas portugueses aí exilados, com destaque para Flausino Torres, pai de Cláudio Torres, o arqueólogo de Mértola, que, numa reunião tempestuosa, confrontou Álvaro Cunhal com o “novo tempo” de um “socialismo com democracia, sem ditadura e sem censura” que se vivia – floresce e morre em poucos meses vítima de uma operação relâmpago das tropas do Pacto de Varsóvia; a Primavera de Marcelo Caetano, que sucede a Salazar em Agosto, dá esperanças de mudança a uns quantos crédulos; em França estudantes revoltam-se no que ficou conhecido como Maio de 68; o assassinato de Martin Luther King, na pátria da democracia moderna, leva ao aumento da luta contra a segregação racial e pelos direitos cívicos; sem esquecer a morte, a tiro, do candidato à presidência dos Estados Unidos da América, Robert Kennedy…
Foi o ano dos Jogos Olímpicos no México; mas também do “Massacre de Tlatelolco”, na Praça das Três Culturas, Cidade do México, dez dias antes do começo dos jogos, que deviam simbolizar a paz entre os povos, mas que provocou um número de mortos entre os 200 e 300. Instabilidade política e manifestações estudantis levaram a que o Presidente Ordaz Bolanos, pressionado pelos americanos, ordenasse a ocupação do campus da Universidade Nacional Autónoma do México. O reitor Javier Barros Sierra demite-se, milhares de estudantes e trabalhadores protestam em Tlatelolco, Praça das Três Culturas, sendo cercados por forças militares equipadas com carros blindados e massacrados.
Em Outubro de 1997 foi aberto um inquérito e antigos governantes admitiram que os manifestantes não estavam armados e que havia intenção de acabar com o movimento estudantil. Em 2006 o presidente Echeverria foi acusado de genocídio, mas o juiz alegou a prescrição processual para não ser julgado.
O episódio que marcou os Jogos da Cidade do México foi a cerimónia do podium dos 200 m, no atletismo. Tommie Smith - «se ganho sou americano, não um americano negro. Mas se fizer alguma coisa má, dirão que sou “um preto”. Somos pretos e temos muito orgulho nisso» - ganha a medalha de ouro, John Carlos a de bronze e Peter Norman, australiano, a de prata.
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Na altura do hino americano, os dois negros erguem os punhos fechados, com luvas negras, num gesto que foi entendido como a saudação do Black Power, tornando-se mítico na luta dos afro-americanos pelos direitos civis. Mais tarde, Smith, na autobiografia, afirmou que “o gesto não era uma saudação do Black Power, mas uma saudação pelos direitos humanos”.
Recordo os comentários exaltados e coléricos do nosso jornalista, de quem não quero lembrar o nome, na televisão, e como me alegrei com aquela atitude de grande coragem. Recebidos na América como heróis pela comunidade afro-americana, sofreram ameaças e rotulados de antipatriotismo por outros. As medalhas foram-lhes retiradas, mas, trinta anos depois, homenageados pela contribuição para o movimento pelos direitos cívicos nos EEUU.
Importante foi a contribuição do australiano medalhado. Apoiou os americanos usando no pódio um distintivo de apoio ao Projecto Olímpico para os Direitos Humanos – OPHR – e declarou-lhes que o gesto seria maior do que um feito atlético. Abandonou o atletismo depois de ter sido impedido de participar nas eliminatórias para os Jogos Olímpicos de 1972.
Em Agosto de 2012 o Parlamento Australiano agradeceu-lhe, postumamente, a sua contribuição para o atletismo e para os Direitos Humanos. Disse J. Carlos, em entrevista: «Não há ninguém na Austrália mais merecedor de honra do que P. Norman no que ao humanismo diz respeito».
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