OS ÚLTIMOS DO ESTADO NOVO

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Chega agora aos escaparates das melhores livrarias nacionais Os Últimos Do Estado Novo, um extraordinário volume editado pela Tinta da China e que tem como móbil primário um olhar completamente inusitado sobre diferentes protagonistas do Estado Novo: seus colaboradores e apoiantes, mas também aqueles que lutaram contra a opressão e as políticas intimidatórias e de repressão.

Por Telmo Nunes (Colunista)

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José Pedro Castanheira será por muitos reconhecido como um dos grandes nomes do jornalismo português, sobretudo a partir do último quartel do século XX e até aos nossos dias. Embora com formação de base em Economia, desde cedo enveredou pelo jornalismo, tendo feito uma pós-graduação na área e trabalhado em jornais de grande destaque, como são exemplos A Luta, O Jornal e, durante quase trinta anos, o Expresso, onde se dedicou afincadamente à grande reportagem e ao indispensável, mas cada vez mais raro, jornalismo de investigação. Vencedor de inúmeros prémios, de onde se destacam alguns dos mais prestigiados atribuídos em Portugal, é autor e coautor de diversas obras de referência, das quais sobressaem Jorge Sampaio: uma biografia (2 vol., 2012/2017) e Volta aos Açores em 15 Dias (2022), a sua primeira incursão literária fora do âmbito jornalístico e que lhe valeu a distinção com o Grande Prémio de Literatura de Viagem APE – Maria Ondina Braga. A propósito deste, o autor esteve recentemente em périplo pelo nosso arquipélago (pelo qual sente especial atração), dando a conhecer a todos esta obra singular, que granjeia, com toda a justiça, o seu lugar junto dos mais belos livros de viagens que têm os Açores como ponto de referência. Como se escreveu a propósito desse extraordinário diário de bordo, VA15D - como o autor decidiu nomeá-lo - é «o sentimento ilhéu [que] lhe molda as ilhargas do coração.»

 

 

Volvido praticamente um ano após essa publicação, chega agora aos escaparates das melhores livrarias nacionais Os Últimos Do Estado Novo, um extraordinário volume editado pela Tinta da China e que tem como móbil primário um olhar completamente inusitado sobre diferentes protagonistas do Estado Novo: seus colaboradores e apoiantes, mas também aqueles que lutaram contra a opressão e as políticas intimidatórias e de repressão. Castanheira não inclina a sua atenção para os de sempre, para os grandes vencedores e que, a cada ano, são justamente lembrados aquando da comemoração da Revolução dos Cravos. Ao invés, o autor lança o seu olhar sobre os perdedores. «Dos fracos não reza a história», assim se abre a apresentação do livro assinada pelo próprio José Pedro Castanheira, acrescentando pouco depois que, «Dos fracos, mas também dos acabados, dos abatidos, dos esgotados, dos desistentes, dos covardes, dos derrotados – dos últimos.» Efetivamente, se nos detivermos a pensar, quando mencionados, são-no meramente para servir de contraponto à glória investida nos lutadores vitoriosos.

 


 

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Durante os vinte e oito anos de trabalho no semanário Expresso, coube ao autor a tarefa de organizar a fórmula comemorativa da data, preferencialmente uma que se distinguisse pela diferença e inovação. Sendo partidário da ideia de que o «25 de Abril foi o acontecimento mais marcante do século XX português, não apenas para [si], mas para a esmagadora maioria dos portugueses», foi-se interrogando que diferentes razões teriam justificado uma tão prolongada ditadura no nosso país, «a mais longa ditadura pessoal do século XX». Mantendo por premissas estas dúvidas, partiu «à procura das razões que explicariam a espantosa longevidade do Estado Novo», ao que se seguiram diversos contactos, telefonemas, viagens, muitas conversas com pessoas pertencentes “à máquina” que manteve toda aquela estrutura a funcionar durante tantos anos, pessoas ligadas ao partido único, à PIDE, e a outras estruturas de grande relevo. Desses trabalhos, realizados ao longo dos anos, destacam-se o último diretor da censura, o último presidente do partido único, o último responsável do campo de concentração do Tarrafal, os membros do último Governo da ditadura, o último secretário pessoal de Marcello Caetano, o último deportado, os últimos presos políticos, a última entrevista dada por Oliveira Salazar.

 

 

É a partir desses trabalhos jornalísticos que surge o título do livro agora em apreço, assumindo-se imediatamente como inevitável: Os Últimos do Estado Novo.

 

 

A obra chega dividida em capítulos, que surgem organizados numa linha cronológica invertida, ou seja, abre o volume o acontecimento mais recente, “O Último Diretor do Campo do Tarrafal”, encerrando-o o acontecimento mais longínquo na linha temporal, “O Último Plenário Dos Sindicatos Corporativos”.

 

 

Este é um livro surpreendente e factualmente muito rico, recheado de inúmeros pormenores extremamente interessantes que, por motivos que ultrapassam a compreensão, não surgem nos compêndios escolares e, por isso, facilmente passam ao lado do conhecimento da maior parte da população portuguesa atual.

 

(Continua)

 

 

José Pedro Castanheira, Os Últimos Do Estado Novo, Tinta da China, 2023

ISBN: 978‑989‑671‑771

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